ARQUITETURAS ELETRO-ELETRÔNICAS

 

“CONCEITUAÇÃO”

 

 

 

 

ELETRÔNICA EMBARCADA EM AUTOMÓVEIS

Antes de explorarmos as mais variadas alternativas tecnológicas para arquiteturas elétricas, devemos ter em mente o que significa a expressão “Eletrônica Embarcada”. Eletrônica Embarcada representa todo e qualquer sistema eletro-eletrônico montado em uma aplicação móvel, seja ela um automóvel, um navio ou um avião.

Há muitos anos, a indústria automotiva tem feito uso de sistemas eletro-eletrônicos no controle das várias funções existentes em automóveis de passeio e comerciais.

Observamos nos veículos atualmente comercializados, que boa parte destes sistemas de controle foi desenvolvida de forma independente, no sentido que cada um é responsável por um determinado tipo de função no veículo.

Em contra-partida, o real domínio sobre os diversos dados eletrônicos disponíveis em um automóvel é mais facilmente conseguido através da utilização de sistemas eletro-eletrônicos interligados, cada qual responsável por uma parte do veículo, mas compartilhando informações entre si.

Sistemas desenvolvidos dentro deste contexto têm sido disponibilizados pelos mais variados fornecedores de componentes automotivos e empresas montadoras de veículos, dando a impressão ao motorista e passageiros de que o controle do automóvel é totalmente integrado, muitas vezes deixando a sensação de existência de uma única unidade de controle inteligente – uma espécie de cérebro.

A figura 1 mostra a relação entre algumas informações disponíveis em um automóvel e algumas funções afetadas por elas.

Figura 1

Perceba que, enquanto o sinal da Chave de Ignição é importante no funcionamento dos cinco sistemas apresentados, o sinal de Velocidade do Motor importa apenas ao Painel de instrumentos.

 

ALTERNATIVAS TECNOLÓGICAS À ARQUITETURA ELÉTRICA

As formas como os diversos sistemas de controle são implementados e interconectados em uma aplicação embarcada são chamadas de Arquiteturas Eletro-Eletrônicas (ou simplesmente Arquiteturas Elétricas).

No setor automotivo, dentre os diversos conceitos de arquitetura elétrica atualmente utilizados, podemos destacar dois: Arquitetura Centralizada e Arquitetura Distribuída.

 

Arquitetura Centralizada

Quando analizamos determinadas aplicações, encontramos uma única ECU responsável por receber todos os sinais de entrada (como os sensores e chaves de comando), processá-los e comandar as respectivas saídas de controle do sistema (como as válvulas e relés).

O que é uma ECU ?

ECU é a abreviação de Unidade Eletrônica de Controle (Electronic Control Unit) e, fisicamente, nada mais é que um módulo eletrônico responsável por realizar um determinado controle. No caso da Arquitetura Centralizada, uma única ECU é responsável por todo o tipo de controle existente no sistema.

Figura 2

O diagrama esquemático que representa este conceito de arquitetura é apresentado na Figura 2.

Dentro da chamada “ECU Central” são encontrados Hardware e Software que permitem a leitura das entradas, seu processamento e a atuação das saídas.

 

Como vantagens desta arquitetura podemos destacar:

·        Simplicidade do Hardware utilizado na implementação do sistema, sendo constituído basicamente pelos sensores e atuadores, uma ECU para o devido controle do sistema e, obviamente, o cabeamento que os conecta.

·        Todos os dados de entrada estarão disponíveis à ECU durante toda a operação do sistema, não sendo crítica a lógica de varredura e coleta de informações de cada um dos sensores existentes.

 

Como desvantagens podemos destacar:

·        Grande quantidade de cabeamento requerido para conectar os sensores e atuadores à ECU, especialmente em grandes aplicações, o que dificulta a manufatura do veículo e a sua eventual manutenção.

·        Limitação das possibilidades de expansão do sistema, uma vez que qualquer alteração na ECU significará a modificação de seu Hardware e/ou Software e, eventualmente, na condição de trabalho das funções originais do sistema.

 

Arquitetura Distribuída

Existe a possibilidade de se utilizar, em um mesmo sistema de controle, várias ECU´s interligadas, dividindo entre elas a execução das diversas funções existentes no veículo.

O diagrama esquemático que representa este conceito de arquitetura é apresentado na Figura 3.

Figura 3

 

As ECU´s 1, 2 e 3 são responsáveis pela leitura direta das entradas do sistema, enquanto que as ECU´s 4 e 5 são responsáveis pelo comando das saídas. Além disso, no diagrama apresentado, qualquer uma das ECU´s, dependendo das funções existentes neste sistema de controle, poderá participar do processamento dos dados e da atuação das saídas.

 

Como vantagens desta arquitetura podemos destacar:

·        Quantidade reduzida de cabeamento do sistema, uma vez que, tendo várias ECU´s disponíveis, poderemos instalá-las bem próximas aos sensores e atuadores, reduzindo o cabeamento mais pesado da implementação, formado basicamente por pares e pares de fios utilizados na conexão das entradas e saídas nas ECU´s.

·        Menor tempo de manufatura do veículo (exatamente pela menor quantidade de cabeamento necessário).

·        Maior robustez do sistema de controle, por termos reduzido as possibilidades de quebra de um dos circuitos ou o aparecimento de mal contato em determinado conector (novamente pela menor quantidade de cabeamento necessário).

·        Permite a ampliação do sistema com significativa facilidade, garantindo que alterações em uma determinada função do veículo, impactem somente em uma ou em parte das ECU´s.

·        Facilita a criação do software de aplicação de cada ECU, uma vez que possibilita a sua modularização e distribuição de responsabilidades entre elas.

·        Possibilita a modularização do projeto do sistema e da execução dos testes de validação, aumentando a confiabilidade da implementação e reduzindo os prazos envolvidos no desenvolvimento.

 

Como desvantagens podemos destacar:

·        Obriga a utilização de um meio de comunicação entre as ECU´s, meio este comumente chamado de Protocolo de Comunicação.

·        Implica na existência de um software de controle para a rede de comunicação que interliga as ECU´s, cuja dificuldade de desenvolvimento depende diretamente da escolha do protocolo de comunicação.

·        Difícil determinação da taxa de transmissão ideal para uma dada aplicação, o que impacta diretamente nos tempos internos do software de controle e na escolha dos componentes eletrônicos a serem utilizados no projeto das ECU´s.

 

Explicadas as vantagens e desvantagens fundamentais dos dois conceitos de arquitetura normalmente utilizados, devemos acrescentar que a decisão de escolha de uma delas para uma dada aplicação móvel, depende da ponderação de diversos fatores. Dentre eles podemos destacar:

·        A complexidade do sistema a ser controlado (quantidade de variáveis de entrada e saída e o tamanho físico do sistema).

·        A disponibilidade dos componentes eletrônicos requeridos à montagem das ECU´s e à medição e atuação no sistema.

·        A robustez, mecânica (como às vibrações) e elétrica (como às interferências eletro-magnéticas), requerida pelo sistema a ser controlado.

·        O tempo necessário à implantação da arquitetura (projeto, construção de protótipos e validação).

·        O custo desejado do sistema final (limitações inerentes ao orçamento).

 

O relacionamento entre os fatores anteriormente colocados, considerando-se uma determinada aplicação móvel, é que determinará o conceito de arquitetura mais apropriado ao sistema a ser controlado. Tal desafio é enfrentado quase que diariamente pelas empresas montadoras de veículos.

Uma das maiores dificuldades da engenharia de produtos de uma montadora é determinar a arquitetura elétrica de um novo modelo; garantindo o mínimo de funções desejadas pelos futuros clientes, dentro dos limites de custo de projeto e produto final determinados pela empresa.

Normalmente, os produtos têm seu desenvolvimento iniciado com três ou quatro anos de antecedência ao seu lançamento, o que dificulta ainda mais a tomada de decisão sobre qual seria a melhor solução de engenharia para determinado projeto. Tal trabalho precisa relacionar as visões de Engenharia Avançada (tecnologia), Marketing Estratégico (mercado) e Político-Econônica (orçamento) da região à que se destina o novo produto.

De todo modo, a Figura 4 ilustra a tendência da relação entre a responsabilidade de cada ECU de um determinado sistema de controle e a complexidade deste sistema como um todo, nessas duas alternativas – Centralizada e Distribuída.

Figura 4

 

Analisando friamente cada um dos conceitos de arquitetura apresentados, não só do ponto de vista da evolução tecnológica, mas também das possibilidades futuras de expansão de funções com o mínimo de alteração no sistema de controle do veículo como um todo, podemos considerar a Arquitetura Distribuída a mais interessante.

Diante deste posicionamento, faz-se necessária a utilização de um protocolo de comunicação que permita a interconexão das ECU´s e a troca dos dados pertinentes a cada uma das funções controladas pelo sistema. Nesta linha de raciocínio, dentre os diversos protocolos de comunicação existentes, os de comunicação serial mostram-se tecnicamente mais adequados e, mais adiante, dentro desta classe de protocolos, o CAN (Controller Area Network) tem grande destaque.

 

EXEMPLOS DE SISTEMAS EXISTENTES

Após definirmos as arquiteturas normalmente utilizadas em veículos automotores, nada como colocar um exemplo prático de cada uma delas para fiquem claras suas diferenças principais.

A figura 5 mostra um veículo cuja Arquitetura Elétrica é fundamentada no conceito Centralizado. Perceba que são ilustrados, além de dois sistemas de controle (o de Iluminação Externa e o Levantador Elétrico dos Vidros), quatro módulos principais: O ECM (Módulo de Controle do Motor); o Rádio; o IPC (Instrumentos do Painel) e o BCM (Módulo de Controle da Carroçaria).

Neste exemplo, o BCM recebe, de forma discreta, os sinais de entrada (interruptores de comando) dos respectivos sistemas e, após trabalhar internamente com estas informações, atua, também de forma discreta, nas saídas (lâmpadas e motores elétricos). O BCM centraliza o controle destes sistemas, sendo totalmente independente dos demais módulos existentes no veículo.

Da mesma forma, o ECM, o Rádio e o IPC, recebem seus sinais de entrada, processam cada um deles e atuam sobre as respectivas saídas. Como exemplo, o ECM recebe, dentre vários sinais, a Posição do Pedal do Acelerador, atuando em seguida na Borboleta, alterando sua posição. O Rádio, recebe o sinal da Chave de Ignição, atuando no controle Liga / Desliga do sistema. Já o IPC, recebe o sinal de Velocidade do veículo e atua no Ponteiro de Indicação da Velocidade.

Para realizar os controles dentro deste conceito de arquitetura, note que nenhum protocolo de comunicação é necessário. Basta que as ECU´s possuam portas de Entrada e Saída discretas e um algoritmo interno de controle, muitas vezes de concepção simples.

 

Figura 5

 

A figura 6 mostra um veículo cuja Arquitetura Elétrica é fundamentada no conceito Distribuído. Perceba que são ilustrados neste exemplo, os mesmos módulos considerados na ilustração anterior. Entretanto, neste caso, as ECU´s estão interconectadas por três Redes de Comunicação de Dados diferentes:

REDE 1: Responsável pela troca de dados entre o ECM e o BCM 1, esta rede trabalha com taxa de transmissão de dados de alta velocidade.

REDE 2: Responsável pela comunicação entre o Rádio e o IPC, esta rede trabalha com taxa de transmissão de dados de média velocidade.

REDE 3: Responsável pela interconexão dos BCM´s 1 e 2 e o IPC, esta rede de comunicação de dados trabalha com taxa de transmissão de baixa velocidade.

Neste conceito de arquitetura, um sinal recebido por uma das ECU´s poderá ser enviado, através das redes de comunicação, para qualquer uma das demais ECU´s.

Como exemplo, o Sinal de Velocidade do Motor poderia ser medido pelo BCM 1 (por este estar mais próximo do Sensor da Roda Dianteira), colocado por este módulo nas redes 1 e 3, de onde seria coletado respectivamente pelo ECM e pelo IPC que, respectivamente, o utilizariam nos Cálculos do Sistema de Injeção e na Indicação da Rotação do Motor ao motorista.

Perceba que, com apenas uma medição, um determinado sinal pôde ser utilizado por duas ECU´s distintas. Esta é uma das grandes vantagens de uma Arquitetura Distribuída – a maximização da utilização dos dados disponíveis no veículo.

Figura 6

 

A pergunta que deve ser respondida agora é: Como realizar a comunicação entre as ECU´s ?

Ou melhor: Qual protocolo utilizar em aplicações automotivas, garantindo que todos os critérios de desempenho e segurança estejam presentes ?

A resposta para esta pergunta é: CAN Bus (ou barramento CAN), que será detalhado na próxima parte deste artigo.